Artigo de opinião | OE 2021 – o “monstro” continua a crescer

30 Out 2020

O Parlamento aprovou na generalidade, na passada quarta-feira, a proposta de Orçamento de Estado para 2021 (OE 2021).

Criticado à direita por esquecer as empresas e à esquerda, pelo Bloco, por considerar insuficiente o reforço de verbas para o Serviço Nacional de Saúde, o orçamento lá acabou por ser aprovado à justa, com o voto a favor da bancada do PS e as abstenções do PCP, PEV, PAN e das duas deputadas não inscritas – Cristina Rodrigues (ex-PAN) e Joacine Katar Moreira (ex-Livre).

Sejamos francos, a pandemia de Covid-19 torna o exercício de governação verdadeiramente difícil. Os impactos sociais e económicos desta crise são avassaladores e a imprevisibilidade da evolução da pandemia do ponto de vista sanitário e, consequentemente, do desempenho do comércio interno e externo, exigem, por um lado, um enorme esforço assistencialista para fazer face às dificuldades provocadas pela crise e, por outro, um esforço igualmente significativo para estimular a recuperação económica.

À semelhança do que nos tem habituado nos últimos anos, o governo apresentou um orçamento com uma grande carga ideológica. Trata-se de um orçamento marcadamente de apoios sociais e de promessa de investimento público, reflexo das pontes que teve de construir para o aprovar e, porque não dizê-lo, porque para o ano temos eleições autárquicas.

Quanto ao investimento público a ver vamos se não acontece como nos últimos anos, em que o governo inscreve valores ambiciosos nos orçamentos e depois, quer por força do sobreendividamento do país, quer para conter o défice das contas públicas, acaba por ficar muito abaixo em termos de concretização.

Se este orçamento tivesse rosto(s), estavam lá, garantidamente, cunhados os de Ana Mendes Godinho e também de Pedro Nuno Santos (e de Marta Temido, vá lá). Já o do Ministro da Economia apareceria de forma muito ténue e até envergonhado, suponho.

Trata-se de um orçamento que reforça o peso do Estado e que vai deixar marcas para o futuro, aumentando a despesa corrente primária e a dívida pública. A ideia do governo é, por isso, sair desta crise com mais Estado. E isso é uma péssima notícia – o “monstro” continuará a crescer, tornando o Estado cada vez mais pesado, ineficiente e a consumir cada vez mais recursos.

Reconhece-se a importância das medidas assistencialistas tomadas e do esforço orçamental para garantir um mínimo de subsistência a um universo alargado de pessoas, porém era também crucial que o orçamento fosse um instrumento ativo de política económica, prevendo estímulos à competitividade empresarial, à produção e às exportações.

Infelizmente, este orçamento para as empresas não traz quase nada de novo.

São introduzidos pequenos estímulos ao consumo, como a alteração das taxas de retenção de IRS, medida que sendo positiva, tem um impacto absolutamente marginal pelo nível de redução proposto. Representando uma diminuição da receita de cerca de 200 milhões de euros (que comparam com os cerca de 3 mil milhões de reembolsos de IRS que acontecem anualmente), significará um “aumento salarial” mensal de uns 2 a 3 euros por contribuinte (não tendo qualquer impacto nos contribuintes cujas remunerações são mais baixas, que não são sujeitas a retenção).

O chamado IVAucher vale também 200 milhões de euros e procurará incentivar o consumo nos setores da restauração, alojamento e cultura, mas a sua concretização parece bastante burocrática, pelo que se duvida da sua eficácia e deverá apenas ser aplicada no primeiro semestre do ano.

Em sede de IRC, não existe nenhuma medida de desagravamento fiscal. Elimina-se apenas o agravamento das tributações autónomas para as micro e PME que tenham prejuízo fiscal e, ainda assim, condicionada ao cumprimento de obrigações fiscais e da existência de lucro em período anterior. Não se assumiu qualquer medida de redução estrutural das tributações autónomas, no sentido de acabar com esta descabida tributação.

Não se introduz nenhuma medida de alívio da tesouraria das empresas nem qualquer flexibilização dos esquemas de pagamento em prestações que permitam dar resposta às dificuldades de tesouraria que as empresas vão sentir no decurso do próximo ano.

O orçamento não contempla quaisquer medidas de estímulo à capitalização das empresas, para fazer face aos desequilíbrios que estão e vão continuar a sentir em 2021.

Não se vislumbra, também, que a requalificação e formação profissional seja prioritária. Não existe nenhuma medida de estímulo e incentivo à formação nas empresas, numa altura em que enfrentamos a maior transição económica da história e que é evidente a baixa produtividade e o desajustamento de qualificações.

Em resumo, estamos perante algumas medidas de impulso ao consumo e fiscais minimalistas, positivas mas pouco dinâmicas, que não atendem aos desafios que a atual conjuntura coloca, nem respondem ao nível de dificuldades vividas pelas empresas nem aos desafios futuros que a economia portuguesa enfrenta.

– artigo de opinião do Diretor Geral da ACB, Rui Marques, no Jornal Correio do Minho

 

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