Revista SIM: Entrevista ao Diretor Geral da ACB
26 Mar 2020

Entrevista ao Diretor Geral da Associação Comercial de Braga, Rui Marques, na Revista SIM
“As empresas não precisam de mais crédito bancário, mas no auxílio nas despesas mensais como salários, impostos e contribuições, créditos bancários, rendas de imóveis.”
Para travar o potencial naufrágio das empresas na luta contra a doença COVID-19, o Governo lançou um conjunto de medidas para mitigar os efeitos imediatos da falta de faturação, algo que, para a instituição é manifestamente insuficiente. Apoiar, efetivamente e sem recurso a crédito que iria criar mais problemas de governabilidade em cada organização, é a proposta da Associação Comercial de Braga, que fará chegar até ao governo as suas preocupações.
– Qual a percentagem de empresas encerradas nos territórios sob a égide da ACB?
Na sequência das medidas tomadas pelo Governo para concretizar o estado de emergência decretado pelo Presidente da República, a generalidade dos estabelecimentos de comércio a retalho, de restauração e de prestação de serviços ao consumidor final, encontram-se encerrados ao público, exceção feita aos serviços essenciais que podem continuar a laborar. Julgo, por isso, que, neste momento, mais de 80% destes estabelecimentos se encontram encerrados.
Ao nível dos setores da indústria e dos serviços prestados maioritariamente a clientes empresariais, uma parte significativa destas empresas está a laborar, mas está a fazê-lo com uma quebra muito significativa no volume de encomendas e de trabalho.
– Qual a posição da ACB em relação às medidas de apoio anunciadas pelo Governo?
A ACB já anunciou publicamente que considera manifestamente insuficientes as medidas anunciadas pelo Governo, até à presente data.
O Governo tem apontado, sobretudo, para as Linhas de Crédito como a tábua de salvação das empresas. Sem desmerecer a importância destas linhas para algumas empresas, julgamos que o paradigma dos auxílios do Estado para mitigar os impactos desta pandemia deve ser outro.
Adicionar mais dívida às empresas apenas vai contribuir para a sua insustentabilidade e ingovernabilidade, a curto prazo. Sejamos claros, as empresas já se encontram exageradamente alavancadas em financiamento bancário, pelo que os auxílios do Estado devem incidir na redução dos encargos mensais mais relevantes, que as empresas, nesta situação de exceção, não conseguirão cumprir – salários, impostos e contribuições, créditos bancários, rendas de imóveis – por incapacidade de gerar receitas.
A ACB defende, por isso, que sejam adotados um conjunto de medidas que, no essencial, desonerem de forma rápida, e sem burocracias, a tesouraria das empresas, sob pena de entrarem, de forma irrevogável, em processos de insolvência sem recuperação, hipotecando a manutenção de milhares de empresas e postos de trabalho. Tomo a liberdade de destacar algumas delas:
- Criação de um regime excecional de suspensão dos contratos de trabalho para as empresas afetadas, que preveja o pagamento da remuneração base aos trabalhadores com contratos suspensos, suportado integralmente pela Segurança Social, isentando a entidade patronal de TSU;
- Isenção da TSU às empresas que, durante a pandemia Covid-19, não necessitem de recorrer ao regime de layoff ou a outro regime de suspensão de contratos de trabalho;
- Suspensão do vencimento de prestações de créditos bancários, nas componentes de capital e juros;
- Adoção de um mecanismo efetivo de aceleração do pagamento de projetos cofinanciados pelo Estado Português ou por Fundos Europeus, quer seja em pedidos de pagamento intermédios, quer em pedidos de encerramento de projetos.
– Teme que haja um despedimento em massa, se a situação se prolongar muitos meses?
Uma intervenção menos pronta e efetiva do Governo e da Segurança Social poderá ter um enorme custo de oportunidade para a economia portuguesa. Acreditamos, firmemente, que o custo de suportar as propostas apresentadas pela ACB será muito menor do que o que será exigido, ao Orçamento do Estado e aos contribuintes, se se perderem dezenas milhares de postos de trabalho em consequência do encerramento das empresas.
Os sinais que temos recebido dos contactos estabelecidos com o Governo mostram-nos que o executivo está muito preocupado com o possível efeito de destruição de postos de trabalho que esta pandemia pode gerar na economia portuguesa. Aliás, na sequência das iniciativas que a ACB e outras associações empresariais têm vindo a desenvolver junto do Governo, e dos resultados da reunião de ontem, dia 23 de março, da Comissão Permanente da Concertação Social foi já assumido pelo Governo que irá alargar o recurso ao layoff simplificado aos estabelecimentos que tenham sido obrigados a encerrar ou suspender a atividade, mesmo que de forma parcial; demonstrada abertura para flexibilizar o regime de marcação e gozo de férias com pagamento posterior do respetivo subsídio; garantido o lançamento de linhas de crédito específicas para o setor do comércio e dos serviços; e acolhida a proposta de criação de moratórias bancarias, bem como de novas medidas de flexibilização das obrigações fiscais e contributivas.
– De que forma a ACB está a apoiar os seus associados, além da informação que disponibilizam nos canais de comunicação?
Todos os serviços da ACB se encontram a funcionar em pleno. No entanto, em cumprimento das orientações da DGS, estamos a privilegiar o contacto por telefone, email ou videoconferência.
A Direção da ACB tem reunido, diariamente, através de videoconferência, para acompanhar o desenvolvimento das repercussões da pandemia Covid-19 nas empresas e tem, também, promovido contactos regulares com o Governo, instituições da Administração Pública, Municípios, grupos parlamentares e partidos políticos, propondo medidas efetivas que, numa primeira fase, permitam salvar as empresas e os seus postos de trabalho, e numa segunda fase, ajudem a relançar as atividades económicas.
Julgamos que, nesta fase crítica, é crucial informar e orientar as empresas relativamente aos mecanismos de ajuda a que podem recorrer. Daí que estejamos a prestar uma atenção muito especial à compilação de toda a legislação que tem sido publicada e a divulgá-la, da forma mais rápida e simples possível, aos nossos associados, colocando à disposição dos associados os nossos serviços jurídicos e de aconselhamento fiscal para ajudarmos as empresas a tomarem as melhores decisões.
Estamos, igualmente, a desenvolver esforços, em parceria com algumas entidades regionais e nacionais, para que possamos apoiar as micro e pequenas empresas do setor do comércio e da restauração a aderir a processos rápidos de digitalização das suas operações, de forma a aumentar a sua capacidade de gerar receitas durante o período de encerramento ao público.
– Qual a mensagem que gostaria de enviar a todos os associados?
Os empresários sempre estiveram na linha da frente do combate às crises e possuem a força e resiliência necessárias para vencer esta “guerra”, contra uma pandemia que vai gerar fissuras graves no nosso tecido empresarial e base económica.
A união e o comportamento responsável de todas as organizações e cidadãos são cruciais para o sucesso da nossa intervenção contra a ameaça que nos atormenta.
Nos próximos meses, a todos se exige uma redobrada capacidade e espírito de solidariedade, adaptação e sacrifício, tendo como foco principal a preservação de vidas humanas e o futuro da nossa economia.
Os associados podem, por isso, contar que a ACB estará sempre na linha da frente na defesa intransigente dos interesses dos seus associados, ainda que, por vezes, esta defesa seja efetuada fora do espaço mediático, o que não quer dizer que não esteja a ser feita ou até que não seja mais eficaz.
Contem connosco.